domingo, 17 de abril de 2016

Dia D, Hora H

Participei muito discretamente do atual momento político.
Minha voz não chega a tanta gente quanto acredito que pudesse ser útil a esta causa. Por isso mesmo, nem este blog nem qualquer outro espaço virtual onde me apresento me serviram até o momento como tribuna.
Meus textos são invariavelmente ignorados por muitos. Alongo-me natural e deliberadamente, para melhor me expressar de acordo com alguma ideia, opinião, inspiração que tenha. Isto só já afugenta um bom número de pessoas que de alguma forma me conhecem. E já me proporciona uma espécie de "seleção natural" que para mim, neste caso, chega a ser conveniente. Os que não gostam de ler nem sequer vêm aqui, onde praticamente nada mais que palavras, que textos encontrarão. E ponto.
Já os que leem habitualmente e graças a isso têm referências culturais suficientes, em geral não só leem como apreciam meus escritos, concordando ou não com minhas ideias. Quando aqui se manifestam em comentários são sempre respeitosos, atinados, nada radicais nem superficiais, nem exageradamente nada. Correspondem, assim, perfeitamente ao que lhes ofereço em termos de comportamento: urbanidade, respeito incondicional às pessoas, essas e muitas outras coisas. O retorno que obtenho é, para mim, qualitativamente satisfatório.
Assim, por mais modestamente que seja, tenho meu leitorado. É com este leitorado que dialogo. Um leitorado plural, variado, includente, no qual nem todos se parecem comigo ou são meu espelho. Nem todos torcem pelo meu Botafogo ou pelo meu Internacional (sou gaúcho). Nem todos são neutros como eu em assuntos religiosos, nem todos comungam de todas as minhas ideias e preferências, o que é simplesmente natural e não faz sentido para mim buscar outro leitorado, que seja quantitativamente mais expressivo mas com gente que se comporta em público em completo desacordo com a maneira como eu mesmo me comporto, em público ou não. Nunca xingo, nunca insulto, nunca ofendo ninguém. A forma sutil que descobri de não convidar quem faz habitualmente tudo isso sem precisar ser explícito a este respeito foi esta, e tem funcionado muito bem. Os precipitados de língua geralmente não leem textos um pouquinho mais longos. Fico livre deles, assim. Quem aqui chegar com intenções de trolagem, por exemplo, simplesmente não se sentirá à vontade, se chegar a perceber que destoa não só do meu discurso, como também do de todos os demais comentaristas.
Mas hoje vim tocar o Bonde com outro assunto. O título já diz do que se trata. Neste domingo que nacionalmente promete um fervilhamento de opiniões, de ocorrências, etc., venho falar um pouquinho sobre a situação atual do país conforme a vejo.
Não pretendo soar paladino, dono da verdade ou coisa assim. Venho apenas externar algumas opiniões minhas a meu modo em meu próprio espaço virtual.
Acho um pouco ridícula essa divisão da opinião pública entre dois times: o dos coxinhas e o dos petralhas.
Mas a divisão aí está, ela já se impôs e não há nada que eu possa fazer a respeito disso; não é por declarar aqui que a acho ridícula que alguma coisa relevante acontecerá no sentido de dissolvê-la ou sequer de enfraquecê-la. Sou realista e sei que me dirijo a pouca gente, pelos motivos já mencionados e por outros.
Tenho amigos virtuais em ambos os times. Ninguém é ou deixa de ser meu amigo só por vestir esta ou aquela camisa.
Um amigo inclusive se manifestou sobre isto de uma forma interessante. Ele não é nem coxinha nem petralha e aponta o desconforto que sente ao não apoiar nenhuma dessas duas 'facções'. Ambas parecem cobrar-lhe uma posição. Então ele publicou alguma coisa dessas prontas em que o autor não é identificado. O questionamento ali apontava para quatro questões: Dá pra defender esse governo que aí está? Dá pra apoiar essa oposição que aí está? Dá para acreditar nessa imprensa que aí está? Dá pra dialogar com esse povo que aí está?
A mais óbvia resposta seria um sonoro NÃO para todas.
Já fui de odiar. Odiei o governo militar quando ainda era um jovem universitário. Odiei o Chagas Freitas, em quem via apenas uma figura pública cheia de demagogia, dono de um daqueles jornais que exploravam o agrado popular pela crônica policial sensacionalista, dos quais se dizia que se a gente torcer, sai sangue, bem ao agrado de uma fração da população que talvez jamais chegue a entender o que é o PIB.
Odiei muito o Amaral Neto, que se aproveitando dessa fácil instilação de ódio no povo puxou um plebiscito pela pena de morte no Brasil. Cheguei a escrever uma carta aberta para mandar aos principais jornais dizendo que esse plebiscito não contaria com meu voto favorável nem se me garantissem que a pena de morte seria revogada logo após a primeira e única execução, do próprio Amaral Neto.
Pois nesse 2016 completarei 60 anos. Não me acho mais em idade de odiar ninguém.
Ser um desses 'justiceiros' baratos para atrair com pura e cínica demagogia um grande número de adesões a essas 'ideias' de sempre mas bolsonarianas, datenianas e quejandas, para atualizar um pouco, é coisa que está completamente fora de questão, como sempre esteve e estará.
Mas essa instilação de ódio fácil e bem sucedida continua me incomodando porque vejo seus frutos.
Salta aos olhos, para mim, a superficialidade de quem propõe ou engole esse tipo de discurso.
Alinho-me com os que parecem pensar, refletir. Vendo os vídeos do professor Karnal, por exemplo, o povo ganharia muito mais. Mas são vídeos que falam de coisas mais profundas, de maneira muito bem fundamentada. Naturalmente, os que os assistem, compreendem e opinam são em média pessoas de escolaridade bem mais alta.
Uma ótima piada dele diz mais ou menos: "Se fosse assim, seria fácil. Eu trocaria Hamlet por Paulo coelho e seria feliz." Está num vídeo onde ele discorre interessante e ponderadamente sobre essa coisa de haver um único culpado por todos os males do país, que bastaria "fritar" para os problemas todos acabarem, principalmente no que diz respeito a corrupção.
Não posso concordar com os demagogos de agora, esses que instilam esse visível e denso ódio nos que aceitam suas alegações e manobras.
Sou de um tempo em que já se falava o diabo de dois poderes: o executivo e o legislativo. Isso aconteceu inclusive em todos os governos anteriores ao presente século, sem exceção. E a corrupção já corria solta, também, naqueles antigamentes. Mas o judiciário sempre me parecera, se não inatacável, ao menos inatacado. Alguma coisa havia ali que não dava margem à opinião pública para falar "isso" deles. Mas lá se foi esse tempo.
Hoje temos juízes claramente partidários, clara e totalmente comprometidos com resultados previamente arranjados. Quem conhece o "Le Monde" não diria que ele se alinha ou identifica com a nossa banda 'petralha'. Pois justamente ali saiu recentemente uma matéria sobre o Brasil que claramente apontava entre várias outras coisas nada recomendáveis esse caráter seletivo da nossa justiça. Como brasileiro, só consegui sentir vergonha, vergonha do fato de alguns de nossos magistrados, inclusive notáveis e descendentes de notáveis juristas, terem perdido a vergonha.
Envergonhadamente, tenho dito.